“A Cartomante”, o
escritor narra uma a história do triângulo amoroso entre Vilela, Rita e Camilo,
evidenciando o adultério, tema abordado em várias histórias do autor. Mostra a
visão objetiva e pessimista da vida, do mundo e das pessoas. O autor faz uma análise
psicológica das contradições humanas na criação de personagens imprevisíveis,
trabalhando com insinuações em que se misturam ingenuidade e malícia,
sinceridade e hipocrisia.
O conto sem final
feliz foi publicado por Machado de Assis em 1896 em Várias Histórias. O livro é
representativo da segunda fase do escritor, que abandonou o Romantismo para
inaugurar o Realismo. Assim este conto é o objeto de estudo desta análise, já
que como tantas outras relatam de forma sutil e intrigante aspectos tão presentes
em nossa sociedade.
A cartomante, esta é assim
descrita: "Era uma mulher de quarenta anos, italiana, morena e magra, com
grandes olhos sonsos e agudos." Na adjetivação quase uma antítese. Quem
diz sonsos, parece insinuar a falta de inteligência, a precariedade do diálogo,
olhos de alguém perdido no próprio mundo. Por outro lado, agudos alude ao poder
de penetração desse olhar, no caso o olhar da cartomante, com força para
descobrir o íntimo do outro, até o que está por vir.
Temos um narrador onisciente,
que conta ao leitor uma história de adultério (Vilela, Camilo e Rita). Assim é apresentada a história de uma mulher
casada que se torna amante de um amigo de infância de seu marido. Embora seja o centro da narrativa, o tema do
triângulo amoroso é, na verdade, um pretexto para mais uma revelação dos
dilemas da consciência, da relatividade dos valores, bem como das fraquezas
morais a que todos estão sujeitos, esse sim, o verdadeiro fio condutor dos
contos de Machado.
Vilela é um magistrado que
abandonou a carreira e se casou “com uma dama, formosa e tonta”. Camilo é um
funcionário público e, segundo o narrador, “Camilo preferiu ser nada, até que a
mãe lhe arranjou um emprego público”; Rita, apesar de ingênua, é como as
figuras femininas da galeria machadiana, astuciosa e sedutora “Camilo quis
sinceramente fugir, mas já não pôde. Rita, como uma serpente, foi-se acercando
dele, envolveu-o todo, fez-lhe estalar os ossos num espasmo, e pingou-lhe o
veneno na boca. Ele ficou atordoado e subjugado”. Camilo enfrenta um dilema
moral menos por ser amante de uma mulher casada que por trair a confiança de um
amigo. Deixou de frequentar a casa de Vilela talvez porque quisesse “diminuir
os obséquios do marido, para tornar menos dura a aleivosia do ato”. O narrador
está preocupado em vasculhar os desvãos da consciência, sempre mais reveladores
da essência oculta sob as aparências.
O fim trágico, que não seria
tão surpreendente se o leitor não tivesse a expectativa de um final feliz, é,
no fundo, previsível. O narrador cria uma espécie de armadilha, que prende o
leitor pela identificação com Camilo, e, em seguida, choca-o com o desfecho
abrupto – e irremediavelmente óbvio. Camila e Rita, convertidos em personagens
de dramalhão, são, todavia, punidos não pelo adultério, mas pela
ingenuidade. O homem ser adúltero é uma
forma de legitimar o comportamento masculino, transformando-o em dado natural,
a mulher é o problema. Ela se oferece e se nega, provoca e recusa, tece
cumplicidade e recusa a abordagem – a mulher encarna o lado tentação, o lado
sensualidade, o lado provocação, a culpada pelo adultério.
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